Dysvagando |
segunda-feira, outubro 01, 2001
ELEGIA 1938 (CARLOS DRUMMOND DE ANDRADE)
Trabalhas sem alegria para um mundo caduco, onde as formas e as ações não encerram nenhum exemplo. Praticas laboriosamente os gestos universais, sentes calor e frio, falta de dinheiro, fome e desejo sexual. Heróis enchem os parques da cidade em que te arrastas, e preconizam a virtude, a renúncia, o sangue-frio, a concepção. À noite, se neblina, abrem guarde chuvas de bronze ou se recolhem aos volumes de sinistras bibliotecas. Amas a noite pelo poder de aniquilamento que encerra E sabes que, dormindo, os problemas te dispensam de morrer. Mas o terrível despertar prova a existência da Grande Máquina E te repõe, pequenino, em face de indecifráveis palmeiras. Caminhas entre mortos e com eles conversas sobre coisas do tempo futuro e negócios do espírito. A literatura estragou tuas melhores horas de amor. Ao telefone perdeste muito, muitíssimo tempo de semear. Coração orgulhoso, tens pressa de confessar tua derrota E adiar para outro século a felicidade coletiva. Aceitas a chuva, a guerra, o desemprego e a injusta distribuição Porque não podes, sozinho, dinamitar a ilha de Manhattan.
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